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domingo, 28 de fevereiro de 2010

Você já pensou de onde vem os objetos que você usa diariamente?

Pois veja através do texto escrito pelo antropólogo americano Ralph Linton: A difusão cultural.
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Não resta dúvida que, grande parte dos padrões culturais de um dado sistema, não foram criados por um processo autóctone, foram copiados de outros sistemas culturais. A esses empréstimos culturais a antropologia denomina difusão. Os antropólogos estão convencidos de que, sem a difusão, não seria possível o grande desenvolvimento atual da humanidade. Nas primeiras décadas deste século [séc. XX] duas escolas antropológicas (uma inglesa, outra alemã) denominadas difusionistas, tentaram analisar esse processo. O erro de ambas foi o de superestimar a importância da difusão, esse mais flagrante no caso do difusionismo inglês que advogava a tese de que todo o processo da difusão originou-se no velho Egito.
Mas deixando de lado o exagero difusionista, e mesmo considerando a importância das invenções simultâneas (isto é, invenções de um mesmo objeto que ocorreram inúmeras vezes em povos de culturas diferentes situados nas diversas regiões do globo), não poderíamos ignorar o papel da difusão cultural.
Na época em que os norte-americanos viviam um grande desenvolvimento material e os seus sentimentos nacionalistas faziam crer que, grande parte desse progresso era resultado de um esforço autóctone, o antropólogo Ralph Linton escreveu um admirável texto sobre o começo do dia do homem americano:


"O cidadão norte-americano desperta num leito construído segundo padrão originário do Oriente Próximo, mas modificado na Europa Setentrional, antes de ser transmitido a América. Sai debaixo de cobertas feitas de algodão, cuja planta se tomou doméstica na Índia; ou de linho ou de lã de carneiro, um e outro domesticados no Oriente Próximo; ou de seda, cujo emprego foi descoberto na China. Todos estes materiais foram fiados e tecidos par processos inventados no Oriente Próximo. Ao levantar da cama faz uso dos "mocassins" que foram inventados pelos índios das florestas do Leste dos Estados Unidos e entra no quarto de banho cujos aparelhos são uma mistura de invenções européias e norte-americanas, umas e outras recentes Tira o pijama, que e vestuário inventado na Índia e lava-se com sabão que foi inventado pelos antigos gauleses, faz a barba que e um rito masoquístico que parece provir dos sumerianos ou do antigo Egito.
Voltando ao quarto, o cidadão toma as roupas que estão sobre uma cadeira do tipo europeu meridional e veste-se. As peças de seu vestuário têm a forma das vestes de pele originais dos nômades das estepes asiáticas; seus sapatos são feitos de peles curtidas por um processo inventado no antigo Egito e cortadas segundo um padrão proveniente das civilizações clássicas do Mediterrâneo; a tira de pano de cores vivas que amarra ao pescoço e sobrevivência dos xales usados aos ombros pelos croatas do século XVII. Antes de ir tomar o seu breakfast, ele olha a rua através da vidraça feita de vidro inventado no Egito; e, se estiver chovendo, calça galochas de borracha descoberta pelos índios da América Central e toma um guarda-chuva inventado no sudoeste da Ásia. Seu chapéu é feito de feltro, material inventado nas estepes asiáticas.
De caminho para o breakfast, para para comprar um jornal, pagando-o com moedas, invenção da Líbia antiga. No restaurante, toda uma serie de elementos tomados de empréstimo o espera. O prato é feito de uma espécie cerâmica inventada na China. A faca é de aço, liga feita pela primeira vez na Índia do Sul; o garfo é inventado na Itália medieval; a colher vem de um original romano. Começa o seu breakfast com uma laranja vinda do Mediterrâneo Oriental, melão da Pérsia, ou talvez uma fatia de melancia africana. Toma café, planta abissínia, com nata e açúcar. A domesticação do gado bovino e a ideia de aproveitar o seu leite são originárias do Oriente Próximo, ao passo que o açúcar foi feito pela primeira vez na Índia. Depois das frutas e do café vem waffles, os quais são bolinhos fabricados segundo uma técnica escandinava, empregando como matéria-prima o trigo, que se tomou planta doméstica na Ásia Menor. Rega-se com xarope de maple, inventado pelos índios das florestas do Leste dos Estados Unidos. Como prato adicional talvez coma o ovo de uma espécie de ave domesticada na Indochina ou delgadas fatias de carne de um animal domesticado na Ásia Oriental, salgada e defumada por um processo desenvolvido no Norte da Europa.
Acabando de comer, nosso amigo se recosta para fumar. Hábito implantado pelos índios americanos e que consome uma planta originária do Brasil; fuma cachimbo, que procede dos índios da Virginia, ou cigarro, proveniente do México. Se for fumante valente, pode ser que fume mesmo um charuto, transmitido à America do Norte pelas AntiIhas; por intermédio da Espanha. Enquanto fuma, lê noticias do dia, impressas em caracteres inventados pelos antigos semitas, em material inventado na China e por um processo inventado na Alemanha. Ao inteirar-se das narrativas dos problemas estrangeiros, se for bom cidadão conservador, agradecerá a uma divindade hebraica, numa língua indo-européia, o fato de ser cem por cento americano.”

FONTE: LARAIA, Roque de Barros. CULTURA. Um conceito antropológico. 11 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1995.

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